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terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Making An Opinion


O Homem Que Copiava trazia um personagem que montava suas ideias a partir de apenas parte do que conseguia ler, enquanto fazia fotocópias das centenas de páginas que recebia diariamente. Um reflexo dos milhares de sites existentes hoje em dia e da facilidade de se ler apenas as manchetes nos portais, o filme de Jorge Furtado apresentava os principais sintomas da atual Era da Informação.

Ao mesmo tempo em que existe uma quantidade enorme de dados disponíveis para consumo, há pouco tempo para se dedicar à análise crítica e assimilação do material, além de uma pré-disposição para dedução e conclusão a partir de apenas parte, fragmentos, de um contexto. E como nunca foi possível a divulgação (nem mesmo a criação) de relatos, notícias e histórias totalmente isentos - seja por ideologia, má intenção ou imperícia - a árdua busca pela verdade, pelo real, se torna um exercício complexo, talvez inatingível.

E foi neste mundo que surgiu, e se tornou um fenômeno global, Making a Murderer. Cuidadosamente editada e estruturada, desde sua sequência de abertura - que remete às de True Detective (no visual) e de Game of Thrones (com o tema musical), a série da Netflix faz um ótimo trabalho em conduzir o espectador de uma forma pessoal e muito envolvente. E a natureza polêmica do assunto levou ao resto: centenas de especulações, debates acalorados e surgimento de teorias 'plausíveis' sobre o que de fato teria acontecido vieram à tona após o término dos episódios, como se tratasse de um embate entre Lannisters, Starks e Targaryens e não do sofrimento pelo qual pessoas reais passaram e ainda passam.

Esta sensação de ficção é apenas um dos perigos de Making a Murderer. A outra, e muitos vão perceber facilmente antes mesmo de buscar informações adicionais pela rede, é de ser praticamente unilateral. Não que os realizadores tentem esconder isto, haja visto o título escolhido - "Criando um Assassino". Mas, quem se entrega plenamente à narrativa pode se esquecer de que certamente houve omissão de depoimentos e provas, neste documentário que mostra apenas cerca de 3 a 4 horas de um julgamento que durou 27 dias. Pode até existir um justo contraponto face a quanto a mídia e o promotor Ken Kratz injetaram na opinião pública antes e durante o julgamento em desfavor ao benefício da dúvida de Steven Avery, mas se guiar cegamente somente pela série para decidir pela absolvição do acusado é errado.


Da mesma forma, muitos buscaram artigos e dados na internet após assistirem ao seriado, somente para concluir, com convicção, que foram manipulados por uma série parcial e que não houve nada de errado com a sentença dada no tribunal. E, claro, também menosprezaram que poderiam estar à mercê de artigos tendenciosos e, mesmo que inconscientemente, de suas próprias convicções e deduções irracionais.

O grande feito da série é expor, por um lado ou por outro, a síndrome em que a sociedade atual vive: em constante julgamento e condenação, enraizando opiniões irredutíveis, a partir de partes de fatos e/ ou informações parciais. E, estabelecida a soberana posição, pouco importam as consequências reais - é hora de partir para o próximo clique. Ou a próxima fotocópia.

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